As reduções indígenas Guaranis, fundadas a partir de meados de 1.500 e mantidas até meados de 1.700 pelos jesuítas espanhóis no sul da América, deixaram vários patrimônios genéticos animais para o Brasil. São conhecidos o cavalo Crioulo, o bovino Crioulo Lageano e a ovelha Crioula. Porém, pouca importância se deu para os porcos crioulos, que deram origem a uma raça exclusiva do Sul, o Porco Moura, que assim como todas as raças de porcos brasileiras, hoje corre sério risco de extinção.
O resgate da raça Moura é o foco de um projeto que já dura décadas no Departamento de Zootecnia da Universidade Federal do Paraná. O trabalho, desenvolvido na Fazenda Experimental do Cangüiri, foi iniciado em 1985 pelo professor aposentado Narcizo Marques da Silva (responsável pelo registro oficial da raça em 1990). Interrompido em 2002, foi reiniciado em 2014 pelo professor Marson Bruck Warpechowski, resultando no projeto de extensão “Porcos Moura – Caracterização de Sistemas Tradicionais e Fomento à criação de suínos de raças nacionais”, com participação e vice-coordenação da professora Juliana Sperotto Brum, do Departamento de Medicina Veterinária da UFPR.
O primeiro passo, em 2014, foi procurar novamente os animais, como o professor Narcizo havia feito na década de 1980. Através de extensas pesquisas e contatos com criadores do Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, onde ainda são mantidos pequenos plantéis de porco Moura (por exemplo do Faxinal Emboque – PR, na Serra de Lages – SC, e na Região entre Candelária e a Serra Gaúcha- RS), o professor Marson, com auxílio de sua equipe de pesquisa e diversos colaboradores de outras instituições, conseguiu mapear os remanescentes da raça.
Em trabalho de mestrado do Programa de Pós-Graduação em Zootecnia, defendido por Rosyara Juliatto em 2015, foram encontrados até agosto de 2014, um total de 120 machos e fêmeas reprodutores considerados puros em diversos criadores de subsistência e algumas instituições. Com o desenvolvimento do projeto, que inclui a orientação e auxílio dos antigos e novos criadores para não misturar com outras raças e a obtenção e disseminação de novos reprodutores puros não parentes, a contagem em agosto de 2016 subiu para 310 reprodutores com genealogia controlada, e em agosto de 2017, já havia 430 reprodutores conhecidos, distribuídos em mais de 50 criatórios ligados ao projeto. Isso significa uma resposta ao investimento na orientação e articulação dos criadores, e também na valorização da raça, não somente como ótimos animais para rebanhos rústicos de subsistência, mas para comércio especializado, como iguaria gastronômica buscada por chefes de cozinha ligados ao movimento Slow Food.
“O porco Moura tem um ótimo apelo comercial, é um patrimônio brasileiro que precisa ser preservado. É reconhecido como um animal único, fazendo parte do terroir da região”, explica Marson. O modo de criação, extensivo (solto em pastagem e floresta nativa) ou semi-extensivo, com alimentação baseada em alimentos nativos e restos de culturas (frutas, pinhão, mandioca, batatas e outros tubérculos) dá à carne um sabor específico e marmoreio (gordura entremeada nas fibras) que vem sendo bastante valorizado. A excelência da carne é comparada a raças ibéricas como o Alentejano e o Pata Negra, pois são todas da mesma origem genética que o Moura.
Com peso adulto de até 300 quilos, o Porco Moura é uma das maiores raças em tamanho no Brasil. Tem pelagem escura entremeada de pelos claros (chamado também de tordilho ou gris), com um típico padrão “rajado” e uma estrela na testa que lhe dá nome em algumas regiões. Há diversos chefs de cozinha e movimentos organizados em torno do resgate da raça para culinária, assim como charcutarias e salumerias especializadas, nos três estados do Sul, que estão elaborando produtos de qualidade comparável aos valorizados produtos italianos e espanhóis.
Além disso, várias instituições estão empenhadas junto com a UFPR nas pesquisas em torno da raça, entre elas a EMBRAPA, a UDESC/Lajes, a UEPG e a UEM, o IAPAR, a UNESP Ilha Solteira – SP, Escolas Agrícolas de Pinhais, Palmeira e Lapa -PR, o Instituto Federal Farroupilha de Julio de Castilhos – RS e mais recentemente o Centro Paranaense de Referência em Agroecologia, a Universidade Federal do Rio Grande do Sul, a Universidade de Passo Fundo – RS e a Universidade Federal de Santa Catarina.
Para mais informações sobre o projeto, contatos podem ser feitos diretamente com o professor Marson (marson@ufpr.br) e também há uma página no Facebook: https://www.facebook.com/projetoporcomoura/
(Por Simone Meirelles/Sucom/Agrárias)