Trabalhos de geoprocessamento e cruzamento com dados oficiais irão permitir que pesquisadores da Universidade Federal do Paraná (UFPR) descubram as zonas suscetíveis à ocorrência de incêndios florestais em diferentes biomas e regiões. As pesquisas são importantes para se definir áreas a serem protegidas e também para mobilizar estratégias e políticas de prevenção de incêndios.
A doutoranda Neuceli Aparecida Klechowicz está concluindo uma tese que pretende estabelecer um zoneamento de risco de incêndio em uma área situada às margens da BR-116, no estado do Rio Grande do Sul, que compreende 24 municípios. O trecho, de cerca de 400 quilômetros, é mapeado a partir de dados e imagens de satélite disponibilizadas por órgãos oficiais, como o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), Instituto Nacional de Meteorologia (INMET), o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a Embrapa entre outros.
Na prática, ela reclassifica os dados e imagens de satélite gerando os mapas de cada uma das variáveis necessárias ao estudo, como tipo de vegetação, dados climáticos, focos de calor, características topográficas, densidade demográfica e uso do solo. Essas informações são importantes para a definição do risco de incêndio em cada uma das regiões – o que é essencial para que se pense em estratégias de prevenção, por exemplo.
“Cada um desses fatores interfere no risco de incêndio e gera um mapa diferente. A pesquisa utiliza equações ajustadas com pesos específicos para cada uma das variáveis e, com a sobreposição desses mapas, vai obter o zoneamento do risco de incêndios florestais capaz de dizer em quais regiões ou municípios o risco é maior”, explica a pesquisadora, que é orientada pelo professor Antonio Carlos Batista, do departamento de Engenharia Florestal.
Já o trabalho de mestrado de Fernanda Moura Fonseca Lucas, orientado pelo professor Alexandre França Tetto, do departamento de Engenharia Florestal, tem como objetivo desenvolver um zoneamento de riscos de incêndios florestais específico para o bioma Caatinga, pensando principalmente em programas de prevenção e na definição de áreas prioritárias para conservação. “Decidi trabalhar com a Caatinga por ser um bioma que apresenta baixa produção científica, principalmente envolvendo incêndios florestais. Em contrapartida é o terceiro bioma a apresentar a maior taxa de área queimada por ano, atrás apenas do cerrado e amazônia”, comenta.
A questão do fogo nas florestas é mais complexa do que podem sugerir as manchetes de jornais. Isso porque a presença do fogo não é necessariamente negativo: segundo explica Tetto, há áreas que dependem do fogo para que seu ciclo seja respeitado, como o cerrado e mesmo os campos. “O incêndio deve ser sempre combatido, mas a queima pode ter outra finalidade”, explica Tetto, que também atua na capacitação de brigadistas que atuam no combate aos incêndios florestais.
Neste caso, as pesquisas podem focar no manejo do uso do fogo e no regime de fogo: sua frequência, comportamento e período. A pesquisadora Bruna Kovalsyki, por exemplo, faz sua tese para compreender como as espécies herbáceas se comportam com as queimadas, como se regeneram e como se dá esta dinâmica. Já o doutorando Tiago Ferreira busca compreender os efeitos ecológicos do fogo sobre a vegetação arbórea nos campos. “Estão sendo estudadas características específicas das árvores que podem proporcionar maior capacidade de sobrevivência aos incêndios florestais, como a espessura da casca, a altura da árvore e a capacidade de rebrota, dentre outras”, conta. A ideia, a partir daí, é usar algoritmos para modelar a resposta de novos registros em função de diferentes cenários de intensidade da queima.
Um dos trabalhos realizados em laboratório, que auxilia os pesquisadores a compreenderem como se dá o início e a propagação do fogo é com a utilização da câmara de combustão. Atualmente, o Laboratório de Incêndios Florestais trabalha em um teste de retardante químico: a ideia, segundo o Tetto é compreender se, quando aplicado, em diferentes quantidades e concentrações, este produto é capaz de reduzir, ou até mesmo apagar o fogo.
O estudo das chamadas cortinas de segurança também fazem parte dos seus interesses de pesquisa. Esta é uma estratégia para barrar o avanço dos incêndios, utilizando espécies que tenham menor inflamabilidade do que aquela que se quer proteger, aliada à outros usos, como paisagístico, por exemplo.
Incêndio histórico e protagonismo
“Paraná Central está em fogo!” – Assim, em letras garrafais, o extinto jornal Última Hora registrava um dos episódios mais traumatizantes da história do Estado: os incêndios que dizimaram mais de uma centena de habitantes, além de destruírem a fauna e flora de uma área com cerca de 128 municípios. O evento ocorreu em 1963 e parte do trabalho que resultou na elaboração de estratégias para que nunca mais se repetisse foi realizado na UFPR.
O professor do Departamento de Ciências Florestais, Ronaldo Viana Soares, hoje aposentado, foi um dos precursores do trabalho que hoje é desempenhado por docentes e acadêmicos no Laboratório de Incêndios Florestais. A atuação envolve treinamentos de equipes de prevenção e combate ao fogo, elaboração de materiais educativos e didáticos e realização de pesquisas – muitas delas em parceria com empresas da região.
Segundo Alexandre França Tetto, o incêndio de 1963 levou a universidade a projetar equipamentos que hoje são utilizados em todo o país, como a “bomba-costal” e o “pinga-fogo”, viabilizados por meio de uma parceria com uma empresa. “O conhecimento e prática que se tinham naquela época não eram suficientes para combater um incêndio florestal daquela proporção, por isso, após essa ocorrência, muitos equipamentos foram adaptados e continuam sendo utilizados até hoje.
Em função da importância do tema, a própria paisagem do campus do Jardim Botânico foi modificada: uma torre de 25 metros se impõe sobre as árvores, ao mesmo tempo em que serve para mostrar na prática, aos acadêmicos de Engenharia Florestal, como funciona a primeira etapa do combate, que é a detecção dos incêndios florestais.
Outra inovação marcante para o combate e prevenção desenvolvida a partir do conhecimento produzido na Universidade foi o Índice de Perigo de Incêndio, valor numérico apresentado em uma escala a partir de variáveis meteorológicas como a umidade relativa do ar e o número de dias sem chuvas. Estes índices, segundo Tetto, são um indicativo para quem está transitando pelas rodovias, mas também para ações práticas relacionadas à prevenção e ao combate.
(Por Amanda Miranda/Assessoria de Comunicação Social UFPR)